Tem gente que pergunta, tem gente que
quer saber de tudo, tem gente que nem sabe ainda. E pra quem espera, as
notícias são frescas e frias. A névoa começa a chegar pela manhã. Às 7 ainda é
noite e eu me viro de lado pra continuar sonhando. Às 8 e meia um vizinho começa
a gritar de dor. Por tantos minutos fico a olhar o teto baixo de madeira,
ouvindo os gemidos dolorosos do moribundo que nunca vi. Às 10 eu começo, sem
hora de parar. O banho é quente e o café constante. Os doces, muitos. Também
muitos os cheiros e barulhos de Lisboa. A fumaça do cigarro me irrita, muito, e
eles fumam o dia todo. Nuns segundos dá tristeza, numas horas dá saudade e
nesses tempos eu encho a alma de coisa boa: música criola, amigos de ontem, um
samba pra lembrar do que é meu, rosas pra colorir a janela que vê o Tejo. Fado
dá dor de cotovelo, dói até no coração que não sofre. De vez em quando dá
vazio, quando não, só plenitude – paisagens novas, novos lugares, olhares, novo
velho mundo que se renova. Novos movimentos me encantam: as danças negras que
rolam por cá, as línguas que se misturam com as misturas do mar, os calouros
vestidos em capas pretas a cantar pelas ruas da cidade. Ao contrário das apostas,
não arrumei um português, nem gajo de terra alguma. Tenho visto muita gente
bonita e gente feia também. Tenho visto muita gente de todo tipo. Não como
direito, ando mais que as pernas, danço em castelos, leio no metrô. Uns
marinheiros passam pela rua, umas senhoras estendem roupa no varal fora da
janela. Minha coluna dói, meu dedo do pé melhora, os livros começam a se
multiplicar na estante. Vou seguindo um bocadinho cansada, mas bem, bem feliz
de estar bem por aqui.
(Foto tirada no Castelo de Monsaraz)