sexta-feira, 29 de março de 2013

Jesus tomando sol

Vendo hoje as manifestações religiosas da sexta-feira da Paixão, vendo as fotos terríveis de Jesus sangrando  postadas nas redes sociais, fico pensando nessa adoração da dor e da morte típica desse mundo. Sempre comento com amigos sobre um texto que li há um tempo atrás, sobre essa importância dada ao sofrimento, ao invés da valorização do amor e da felicidade. Com todo o respeito ao cristianismo, eu que já fui católica apostólica romana (!), hoje prefiro exaltar a alegria do Jesus que dançava, tomava vinho, abraçava e tocava nas pessoas, amava Madalena e adorava as criancinhas. Temos, sim, dor e sofrimento ao longo da vida. Mas temos também muitas alegrias. Não vamos esquecê-las, afinal, se é pra falar da "Paixão" de Cristo, que seja a paixão que nos move para o futuro, a paixão dos seres apaixonados pela vida e pelos outros, essa paixão que bagunça o estômago e nos dá coragem de viver!

Segue o texto, de Antonio Prata, que reproduzo aqui depois de vasculhar meus emails antigos. Vale muito a pena reproduzir a ideia. Vai que cola?!


JESUS TOMANDO SOL


Por que amor e felicidade são menos importantes que dor e sofrimento?


 Você já reparou que somente histórias envolvendo alguma forma de sofrimento nos livram de um compromisso? Se uma pessoa chega atrasada na escola, ao trabalho ou a um jantar, diz que foi um pneu que furou, uma carreta virada na avenida, o velório da tia-avó ou a gripe do periquito que a atrapalhou.
Sempre problemas. Imagine só se uma amiga sua chega no meio da aula e explica feliz da vida, para a professora: "no caminho eu encontrei um cara lindo, a gente começou a conversar e quando eu vi, já tinham se passado quarenta minutos... Posso entrar?"

Não ía dar certo. Já se ela aparece dizendo: "Putz, professora, o pneu do ônibus furou; o motorista foi trocar e teve um torcicolo e não conseguia se mexer; nesse momento os assaltantes chegaram e me fizeram de refém; minha mãe foi tirar dinheiro pra pagar o resgate e a máquina engoliu o cartão. Tivemos que pedir dinheiro emprestado para minha avó. Por isso cheguei agora". Aí sim ela poderia assistir a aula. Nessas e noutras situações tenho a impressão de que vemos o sofrimento e a dificuldade como mais nobres do que a felicidade e a facilidade. Já presenciei uma conversa em que as pessoas competiam para ver quem sofria mais. Uma disse que pegava dois ônibus até a faculdade. A outra falou: "Eu tenho que pegar dois ônibus e um trem". Uma terceira sorriu, porque a parada estava ganha: "E eu tenho que pegar dois ônibus, um trem, ando dois quilômetros e tenho joanetes". Eu, que moro ao lado, vou a pé e não tenho joanetes fiquei quieto, envergonhado.
Não é à toa que o sofrimento é tão valorizado em nossa sociedade. Afinal de contas, há dois mil e quatro anos o nosso maior símbolo é um homem pregado na cruz. O filho de Deus, que morreu por nós. Por isso, dizem os católicos, temos que ter uma vida de sofrimento e humildemente aceitar desgraças. Que horror! Imagine que bom se em vez do crucifixo cultuássemos um Jesus tomando banho de rio? Ou jogando bola? As pessoas levariam no pescoço pingentes do filho de Deus se preparando para um mergulho, tomando sol ou andando numa bicicleta! Melhor ainda, se nos altares Jesus estivesse dando um beijo apaixonado em Maria Madalena, sua namorada. Aí, ao passarmos por uma igreja ou um cemitério, não faríamos o sinal da cruz, mas daríamos um beijo. E aprenderíamos , desde criancinhas que o filho de Deus veio ao mundo beijar o próximo e mostrar que o amor e a felicidade eram mais importantes que a dor e o sofrimento. Se fosse assim, quando a garota atrasada contasse a história do garoto lindo e da conversa, a professora daria um sorriso e a convidaria a entrar, sabendo que aquela aluna já havia aprendido o mais importante sobre a sua vida.

segunda-feira, 11 de março de 2013

Crise geográfica



O estado de não estar às vezes me parece interessante. Às vezes acho que não. Mas é.

Estar com sua vida toda dentro de malas e caixas, escolhendo o próximo destino, a próxima morada, calculando quilômetros e aluguéis, vontades e necessidades, sonhos e realidade. A verdade que me dói é mesmo essa precisão de estar aqui, nesse mundo de coisas e contas bancárias, onde é preciso preocupar-se mais com o tamanho do salário no começo do mês do que com os banhos de cachoeira que preciso tomar para ser feliz. Precisar pensar o melhor caminho, contar as vantagens e desvantagens de viver onde se escolhe – a casa com jardim perto do mar que ainda é ilusão – é uma necessidade que desumaniza a luz e a sede de alegria e leveza que pulsa no peito.

Estar não estando em lugar nenhum é bom para testar o nível de paciência, consigo e com os outros, e principalmente para se olhar nos olhos e perguntar, sinceramente: o que você quer? O que eu quero? O que você, que sou eu, quer de verdade?E com essa, outras perguntas vão surgindo e traçando um mapa-múndi com interrogações e possíveis respostas corretas. Se é que existem respostas corretas. Se é que existem respostas...

Estar não estando em lugar nenhum é ter que encarar este não-lugar como tudo que se tem de fato. É aprender, na marra, que moramos no mundo e isso basta. Ok, eu tenho essas malas, esses livros e é tudo. Para onde? Para quê?

E mais: é aceitar não se identificar com nada – música, roupa, penteado, comida – nada combina, nada está bom, nada se ajusta. Tudo está fora do lugar. As memórias, as vivências e a imaginação se misturam, o tempo se confunde com ele mesmo e você se perde entre o que foi passado e o que será no futuro, já que o presente é um vazio sem igual. O que será lembrado e o que será esquecido? O que segue na bolsa e o que pesa demais para ser levado? São essas as escolhas e depois delas, o caminhar eterno de quem só tem a certeza de que a felicidade está de portas abertas na próxima paragem. Seja ela onde for.