segunda-feira, 12 de julho de 2010

Coisas bonitas

Ainda cedo, o azul do céu escorrendo pela minha cama, lembrando um dia de alegrias pequenas, sorrisos sinceros, ao lado do par de olhos que tanto brilhavam na despedida da lua, um som de saxofone enrolando meus tímpanos em veludo, o corpo adormece. Amolece lá dentro aquele instante de dor e saudade que queria ficar mais um dia, mais umas horas ou para sempre. Derrete-se aquela fria calmaria de solidão dos instantes calados na porta do peito, como se nenhuma sombra se atrevesse mais a insultar meu sono.

Adormeço. Em sonho – experiência real, acredito – uma dança ou algo assim, uma valsa de leve, um abraço de lado que traz o que é quente, o que alimenta, apavora e encanta. Tudo que cabia no abraço agora já não cabe mais. Ainda cedo. Cedo para braços de paz, para beijos de bom dia, para o chá das cinco, para o fim do filme, para ficar sem fazer nada, orelha jogada na barriga alheia, som de tv.

Amanheço. E ao sentir o tilintar do dia nos cílios longos aparece um fantasma, a sombra que se desmancha com o tempo, mas que existe (temo que nunca deixe de existir). São duas sombras, na verdade, e se desmancham em uma só. Música – vício eterno – café quente, espelho, roupa cheirando a esperança, novidade, gosto bom.

Entardeço. Correm as horas pela minha pele e enxáguam de cansaço o olhar delirante. Bom, este dia, como outro qualquer, sem especialidades, sem surpresa, sem soluços, quase – quase – sem saudade. Impossibilidade, reconheço. Aprendo a viver com ela a cada dia, a ausência. Fazer dela boa companhia, aquela que suporta os gritos desafinados no chuveiro, as folhas rasgadas com poesias tortas e as mensagens madrigais da madrugada.

Anoiteço. Caio junto com as estrelas nessa imensidão de negrume e cheiro de flor. Tentar ignorar as buzinas e sirenes ainda é um esforço presente. Vem-me assim, com frases bonitas e há-braços de todos os tamanhos e intensidades. Longos, assim como são longos os fios molhados que enrolo no tecido, enxugando a face desbotada e as pernas com alguma dor. Fios de lua agora, escorrendo pela cama, que me espera. Boa, esta noite. Leve por causa das canções que descobri sem querer, por causa da voz do garoto que canta como quem ama. E ela me diz sobre verdades universais, desejos de amor e erros nos olhares. Todos os dias acontecem, acontece amor todos os dias. Escondido nas pequenas coisas, essas que meus olhos nem conseguem ver sem lentes corretivas ou esse par de óculos que trazem dor de cabeça. Letra de música, “descreva pra mim sua latitude que eu tento te achar no mapa mundi”. Lembra as distâncias. E a delicadeza do momento se faz maior que tudo, maior que eu, maior que tudo que pude ser, enfim. Com o tempo, esqueço.

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