Ainda na cama via pelo pedaço aberto da janela o branco do
céu do dia 31. Nem azul nem cinza, nem sol nem chuva. Como se preparado para o
ano novo, o céu também se cobriu de branco, como a multidão que pisoteia as areias
de Copacabana. Nem frio nem quente, um
dia sem graça nenhuma, triste até para ser considerado o último. Um número, uma
andadinha no ponteiro do relógio e todos fechando os olhos esperando que tudo
seja diferente a partir de então. Acreditamos.
É sempre bom acreditar.
Acabar o ano sempre me dá uma sensação de urgência, o
sentimento de que deveria ter escrito as metas para o ano que vem, deveria
escrever o que foi bom e o que não valeu a pena, deveria preparar um banho de
rosas e outras folhas para me energizar, deveria ter comprado roupa nova,
deveria , deveria... mas não fiz nada. Acordei como qualquer outro dia, ajudei
no preparo do almoço, tomei banho como sempre. De longe, nada mudou. Mas falam
tanto, jogam tanto na nossa cara que essa é a chance de mudar, de rever, de
refazer, que quando não o fazemos vem a culpa e pronto! Já começo o ano
devendo!
Agora vejo este céu imenso sobre as montanhas mineiras, sentindo
nas pernas os respingos da chuva forte que cai. No instante em que escrevo não
escuto nada além da água que cai pesada, densa, lavando o tempo que se acaba de
2011. Fecho os olhos da alma e coloco na chuva todas as minhas dores sentidas,
as palavras engolidas a seco, as mágoas que ainda retumbam no ouvido e no
peito. Entrego sem apego as tristezas pequenas que tive e todas as despedidas
dolorosas que me obriguei a viver. Aproveito e peço que se lave do mundo a onda
de maldade e injustiça que cada vez mais me deixa descrente de que a humanidade
seja melhor. Que se lave de nossas vistas a pobreza e a desigualdade. Que se
lave de nossos corpos a violência e a obsessão que nos torna mais doentes. Que escorram
na água da chuva todas as más intenções que povoam o cotidiano de quem só quer
viver bem, e nada mais.
A chuva para agora. Acabo o último parágrafo, talvez o último
do ano que deixo escapar. O céu se
acalma, o barulho cessa, o verde reaparece ainda mais verde por trás da cortina
de gotas. Permaneço em silêncio e penso
no domingo, o primeiro, amanhã. Não vou escrever minhas metas nem tomar banho
de ervas. Quem sabe me vista de branco, porque eu gosto de me vestir assim. Quem sabe até faça uma lista de desejos e peça
aos deuses que os realizem no ano que vem. Dois mil e doze já aponta na
esquina, com olhos arregalados, carregando nas costas uma mala enorme cheia de
não-sei-o-quê. Que venha trazendo o que é bom. E que traga para o céu o azul
brilhante, o azul vivo que nos mostre as cores do que é novo. Que seja um céu novo, sem chuva, sem sombra.
Um céu de possibilidades.
Nossa Mariano que lindo e inspirado seu último texto de 2011, adorei.
ResponderExcluirTambém me sinto assim nos fins de ano.
T+
Beijos.